segunda-feira, 5 de abril de 2010

Um olá pra mim.

Adeus você
Eu hoje vou pro lado de lá
Eu tô levando tudo de mim
Que é pra não ter razão pra chorar
Vê se te alimenta
E não pensa que eu fui por não te amar

Cuida do teu
Pra que ninguém te jogue no chão
Procure dividir-se em alguém
Procure-me em qualquer confusão
Levanta e te sustenta
E não pensa que eu fui por não te amar

Quero ver você maior, meu bem
Pra que minha vida siga adiante

Adeus você
Não venha mais me negacear
Teu choro não me faz desistir
Teu riso não me faz reclinar
Acalma essa tormenta
E se agüenta, que eu vou pro meu lugar

~

Canto pra ele.

Ele canta pra mim.

Eu canto pra mim mesma.

Depois do começo o que vier vai começar a ser o fim.

"Eu cheguei em frente ao portão,meu cachorro me sorriu latindo
Minhas malas coloquei no chão. Eu voltei!
Tudo estava igual como era antes, quase nada se modificou
Acho que só eu mesmo mudei, e voltei ..."


"Eu vou me acumulando, me acumulando, me acumulando - até que não caibo em mim e estouro em palavras"
Ai, tanta coisa!
Tô dando um olá para mim, um adeus para você(s).
Pai,
preferia ter tido essa conversa pessoalmente, mas eu entendo que seja difícil pra voce vir. Até respeitei isso por um ano, mas acho que já passou um pouco (ou muito) da hora de você saber como eu me sinto.
Me lembro bem pouco da separação de vocês. Como você trabalhava em São Paulo, achei que era só mais uma viagem, e que logo você voltaria.
Faria o de sempre: me acordaria no meio da noite na cama da vó.
Mas você nao voltou.
Lembro de um dia que eu voltava da escola com a minha mae e voce estava na padaria, tomando café.
Me chamou pra jantar. Fomos ao seu hotel, e lá estava a sua nova esposa.
A mulher com a qual voce tinha traído minha mãe. Você me apresentou a ela, e foi tomar banho.
Naquela noite, ela me mostrou a foto de uma menina, que disse ela ser sua filha. Disse que ao contrário de mim, você estava sempre presente na vida dela, e por a amar muito, fazia questão de estar sempre por perto. Lembro das palavras: do lado, cuidando, apoiando, amando. Ela me disse que só conseguiria me separar por completo de você no dia em que eu estivesse morta, e talvez, se tivesse a chance de ficarmos sozinhas, o fogo seria uma boa opção.
Até hoje não tive coragem de contar isso pra minha mãe.
Acho que isso nunca saiu da minha cabeça. E nem vai sair...
Lembro como minha mãe sempre defendia suas atitudes, dizendo que você era um bom pai, e teimava em repetir uma frase que até hoje me atormenta absurdamente. "Seu pai te ama, mas de um jeito diferente"
Não me lembro em nenhum dia da minha vida sentir que você me amava de verdade.
Ela me criou tentando me dar o melhor possível. Quantas vezes minha mãe fez dívidas, empréstimos pra me dar o que eu queria, ou precisava. Ela esquecia dela mesma, por mim, enquanto você me esqueceu, seja lá por quem.
Ela enfrentou uma traição, foi trocada, passou por crises com você dentro de casa. Me lembro do soco na janela, dos seus porres, seus cigarros, suas drogas todas. E mesmo sendo abandonada, sem nada, nem ninguém, ela lutou para me convencer de que voce era um ótimo pai.
Lembro das perguntas sobre você na escola.
Quem é ele?
Onde ele mora?
No que trabalha?
Lembro do Natal, da virada de ano, da Páscoa, dos meus inumeros aniversarios.
Lembro de não ter tido seus abraços, seus beijos, seus sorrisos..
Lembro de como eu esperava ansiosa e corria a cada vez que o telefone tocava.
O coração acelerava.
E nunca, nunca era você.
Ao contrário de você, a minha esperança nunca me abandonou.
Lembro que gostaria de esquecer de tudo que você me fez passar, mas não foi possivel e ainda não é.
Lembro de voce deixar um telefone e um endereço falsos, deixando-nos com a falsa sensaçao de que sempre saberiamos onde te encontrar. Telefone de uma padaria e endereço inexistente.
Pegou o dinheiro da minha poupança, comprou o carro e foi embora.
Quando você me abandonou, lembro de você prometer nunca me deixar, por que eu era o 'seu tesouro maior'.
E eu era tão pequenininha, pai...
Se eu pudesse, se tivesse como me defender...
Mas não tinha pai, e foi a maior covardia que você já fez comigo.
Lembro de como eu ia esquecendo seu rosto, sua voz..De um lado era ruim, perder a imagem, a figura do pai, do meu pai.
Mas hoje, acho que isso até que foi bom..Por que seria uma imagem, e só.
Não teria sua voz, seu rosto, seu abraço, não teria meu pai.
E ainda não tenho.
Lembro de na escola ter doído muito substituir seu nome nas lembrançinhas do dia dos pais pelo nome do meu avô, e dizer a todos que meu pai tinha morrido.
Até uma certa idade, eu insisti, e minha mãe me ajudou a escolher presentes do dia dos pais pra você. Eu os guardava no canto esquerdo do armário.
Um dia abri essa porta e duzias de presentes caíram no chão.
Caiu minha ficha de que você nao voltaria nunca mais.
A idéia de você morrer me confortava mais do que a de que voce havia me abandonado. A morte não era uma escolha, a sua partida sim.
Hoje, eu tenho medo das pessoas. Medo de gente. Medo de que sumam, me magoem, me façam sofrer.
Hoje, não confio plenamente em ninguem.
Não me deixo chegar perto o suficiente de alguém para que possam fazer comigo o que você fez, para que a história pudesse se repetir.
Tenho e fiz pouquissimos amigos.
Eu já tinha aceitado a sua partida, quando chegou um telegrama com um número. Seu número.
Lembro de ter sido um dos dias mais felizes da minha vida.
Eu te perdoei, e você voltou a morar conosco.
Se eu nesse instante fechar os olhos, lembro da dor das minhas bochechas ao te esperar chegar..sorrindo.
Tinha fé em mim, em você, em nós.
Disse que estava doente, seu nome estava sujo e precisava de algumas coisas.
Roupas, celulares, óculos, malas, perfumes, sapatos.
Minha mãe tirou tudo no cartão dela.
Nós confiamos, acreditamos em você.
Não sei quanto durou, mas essa mistura de fé e paz foi embora rapidamente quando você arrumou as malas.
Dentro de mim, eu sabia, que seria pra sempre..Mesmo voce dizendo que nao faria de novo.
E fez.
Deixei meus medos de lado, acreditei que tudo poderia melhorar, ser diferente dessa vez. Mas foi tudo exatamente igual.
Eu errei ao confiar em voce, te dar uma chance.
Voce de novo me magoou e sumiu.
Mas dessa vez foi pior.
Voce sujou o nome da minha mae, e ficamos numa situaçao muito dificil.
Passei por muitas situaçoes complicadas em relação a amigos, as quais nao vou citar agora, mas voce nao sabe o quanto isso me feriu e me mudou, me fez ser o que sou hoje.
Quando voce saiu de casa cedo, foi uma escolha sua nao ter familia. Mas ao sair daqui de casa, voce estava decidindo por mim se eu teria pai ou nao. Já pensou em me perguntar se eu gostaria de ter pai?
Infelizmente, nunca tive a quem dizer 'Feliz dia dos Pais'.
Eu não conheço a sensação de te abraçar, beijar...te ouvir me desejando parabens!
Voce nao viu minhas conquistas, minhas derrotas, meus tropeços, levantos.
Cresci ouvindo que era identica a voce, mas nao faço a menor ideia do que isso quer dizer, por que nao te conheço.
Deixei por anos de assinar seu nome, por que nao sabia se voce queria ser meu pai.
Minha mae sempre sustentou a casa, a nos duas, meus avós e meu tio, com 1 salario minimo, sem complemento de alimentaçao ou transporte. Os remedios deles, planos, alguns exames que o plano nao cobre ela paga por fora.
Precisei de coisas. Tive vontades, necessidades, sonhos, que foram realizados de acordo com o salario da minha mae.
Reconheço que ela deu um duro danado, e as vezes só a via dentro do onibus, e na hora de dormir e ir pra escola.
Passei por centenas de psicologos, psiquiatras, neurologistas.
Fiz dezenas de exames, tratamentos.
Ja tomei todo tipo de remedios calmantes, anti ansiosidade, anti depressivos.
Voltei a ter medo do toque do telefone, das datas comemorativas, das perguntas sobre voce.
Os vizinhos e conhecidos ainda me perguntam por onde voce anda e tentam esconder aquele olhar de 'coitadinha' quando eu respondo que nao sei, que voce sumiu de novo.
Foi dificil nao ter pai.
Nao saber sobre voce, sua voz, seu rosto. Nao saber o dia do seu aniversario, só perguntando pra minha mae. Nao saber suas historias, do que voce gosta. Sobre voce, sua vida, seus sonhos.
Nao saber por que voce sumiu, por que nao quis me conhecer.
Sempre acho que voce nao queria ter filhos.
Hoje, tenho medo de ter filhos e nem sei se quero tê-los. Passei por isso tudo e nao acho que ninguem no mundo, precise ou mereça passar pelo mesmo. Nao quero correr o risco de ver alguem sofrendo o que eu sofri. Fui envergonhada, magoada e humilhada por sua causa.
Já pedi a Deus que me levasse, já nao aguentei mais a vida, e meus 'pulsos ja foram minha saida de emergencia'.
Hoje, tô fazendo mais um tratamento pai.
Minha ultima crise me rendeu boas lagrimas.
Uma sensaçao de cansaço.
Cansei de você, de mim, da vida, dela, dele, de tudo.
"A minha lucidez que é perigosa."
Tô fazendo exames, tomando medicação.
Reconheço que esses remedios são bem mais fortes que os de antes, e que nao são tomados só por sua causa, mas esteja certo que a sua parte na culpa está ai.
Você foi a ausencia mais presente na minha vida.
Pra ver se dói menos.
Repito pra mim mesma todos os dias que 'Tudo vai Passar', mas já nao acredito mais.
Não passou.
Não passa, nunca.

" Pois quando tomo calmante, eu não ouço meu grito..."

É o primeiro relato de três.
Tô falando é de desistencia.
De exaustão de corpo.
E mais, e pior:
De mente e alma.